Texto experimental, em construção, com pedido, aos amigos e leitores do EPHEMERA, de correcções, sugestões e indicação de outras perguntas para esta FAQ. Depois, a versão final do texto passará a ficar lá em cima.
O MAIS PÚBLICO DOS ARQUIVOS PRIVADOS
O que é o EPHEMERA?
EPHEMERA é um blogue destinado a colocar a público materiais do ARQUIVO / BIBLIOTECA de José Pacheco Pereira. Trata-se de um acervo privado constituído por três fontes principais: a biblioteca e papéis da família Pacheco Pereira, que se encontravam no seu grosso na posse de Álvaro Pacheco Pereira, falecido em 2012; a biblioteca e arquivo de José Pacheco Pereira, cujas primeiras aquisições próprias datam de 1963; e um vasto conjunto de ofertas que vão desde bibliotecas inteiras a espólios completos, para além de muitos núcleos mais pequenos e um contínuo fluxo de materiais, comprados mas, na sua maioria, oferecidos.
É um acervo no seu conjunto generalista, mas com uma forte componente especializada na história política contemporânea, com materiais de arquivo e com colecções únicos em Portugal em certas áreas (como é o caso da colecção de ephemera associada à actividade política). Os espólios mais importantes, cuja lista provisória se encontra em ARQUIVOS INDIVIDUAIS, DE FAMÍLIAS E DE INSTITUIÇÕES, ESPÓLIOS, PAPÉIS, CORRESPONDÊNCIA, FOTOGRAFIAS, VÁRIOS, permitem-me dizer que não é possível estudar muitos aspectos da história contemporânea portuguesa sem passar por aqui.
Por que é que o EPHEMERA não se limita a conservar e divulgar os materiais recolhidos e “cobre” eventos contemporâneos?
Dada a natureza das suas colecções, elas implicam não apenas as aquisições e doações passivas, mas também uma recolha activa, em particular nos eventos cuja cobertura mediática é nula, escassa e “espectacular”, e onde os materiais originais são altamente perecíveis. Que eu saiba ninguém o faz em Portugal e mesmo na maioria dos países europeus, tal prática é pouco comum. Apenas o British Museum enviou uma equipa para recolha dos materiais relativos às manifestações estudantis. No EPHEMERA encontra-se já uma cobertura documental muito completa de várias manifestações, pequenas e grandes, dos últimos anos, que inclui fotografias não só das pessoas, mas também dos cartazes, panfletos, outros materiais, etc.
O EPHEMERA é português ou estrangeiro?
O EPHEMERA é internacional. Tem até hoje (Junho de 2015) materiais de 102 países e de várias organizações internacionais ou transnacionais. Mas o grosso é obviamente português. Porém, desde início se considerou que era importante comparar, por exemplo, entre a propaganda eleitoral europeia e americana, entre a propaganda dos anos trinta e a dos anos sessenta. Movimentos como os comunistas ou a extrema-direita, que têm uma identidade nacional e internacional “forte”, ganham também no exercício comparativo.
De um artigo nos Cadernos BAD: Qual é o “projecto” central desta caça e recolecção? Existe um, mesmo que depois conviva com outras colecções acessórias que vem de arrasto, como aliás é habitual em todos os projectos do mesmo tipo. É o de fazer uma espécie de pequena Bibliothèque de Documentation Internationale Contemporaine (BDIC) em Paris, ou se se quiser uma pequeníssima Hoover Institution on War, Revolution, and Peace, em Stanford, ou um embrião de Instituto de História Social de Amsterdão, para o caso português. Dois arquivos prosseguem objectivos próximos, o Centro de Documentação 25 de Abril da Universidade de Coimbra, e a Fundação Mário Soares. A natureza das suas colecções é semelhante, tem muitos aspectos complementares, embora haja diferenças. Mas é esse o sentido do “core business” desta caça e recolecção.
Está tudo bem no EPHEMERA?
Não, não está. Longe disso. Nem sempre as digitalizações são perfeitas, as fotografias de qualidade, as colecções não estão completas, a cobertura de determinados eventos políticos e sociais, organizações, grupos e partidos é desigual, a distribuição cronológica e geográfica é irregular, a publicação em linha conhece altos e baixos, e há erros que passam despercebidos. Muitas vezes faz falta um texto de enquadramento ou indicações complementares sobre os materiais divulgados. Mas o EPHEMERA é um trabalho de amador que depende do tempo do seu autor e do voluntarismo de quem o tem ajudado e, quem não tem cão, caça com gato.
Quanto custa o EPHEMERA?
Bastante. Muito. Mesmo muito.
Não há um tostão do Estado no EPHEMERA, mesmo quando o seu output na Internet e na preservação e divulgação de documentos únicos e raros, é mais significativo do que muitas entidades altamente subsidiadas com centenas de milhares de euros. Foi assim e vai continuar assim. Sai-me do bolso, nada é dedutível, mas há piores maneiras de gastar dinheiro.
Custa em software e em serviços na rede, em máquinas (scanners, etc.) material de papelaria, estantaria, transportes, luz e água, casas, reconstrução e manutenção de casas, espaço, acima de tudo espaço. Ocasionalmente há serviços pagos como, por exemplo, reproduções de qualidade de cartazes, algumas digitalizações ou transferência de meios (do vinil para CD). Mas são uma excepção muito excepcional, a maioria do trabalho é feito in camera por mim ou por amigos do EPHEMERA.
Os custos de aquisição de livros, papeis, arquivos, espólios, revistas, jornais, etc. quer em Portugal, quer no estrangeiro, tem subido muito, porque as colecções alimentam-se a si próprias e exigem uma procura constante quer nos alfarrabistas, quer em leilões, quer na Internet. Para além disso, há um efeito perverso de sítios como o EPHEMERA: criam um mercado onde ele antes não existia, um mercado muito caótico e predador, que muitas vezes dispersa o que devia permanecer unido. É verdade que tem também um efeito positivo: muita coisa que iria para o lixo, pode agora ser salva.
Mas o mais caro é o tempo. Mais caro que tudo. E o EPHEMERA tem um custo gigantesco em tempo, o bem mais precioso, embora este tipo de trabalho, que aproveita a todos, tenha por cá muito pouco reconhecimento. Seja pelo gosto de o fazer.
É um blogue a melhor forma de divulgar os materiais do EPHEMERA?
Não é. Trata-se de uma opção de circunstância que implica baixo custo (mas não custo zero, porque o espaço de armazenamento, e certas funcionalidades são pagas) e que implica facilidade de colocação dos materiais e exige pouco conhecimento especializado. O WordPress oferece a possibilidade de se criar um CMS (content management system) razoável, mas está longe de poder fornecer a organização e funcionalidades dos sítios profissionais com bases de dados dedicadas. Este site pretende ser a primeira tentativa de combinar o blogue com um local fixo.
Existem outras formas de divulgação dos materiais do EPHEMERA?
Sim. Para além de exposições, como a que se realizou nas comemorações do 40º aniversário do 25 de Abril na Assembleia da República (e depois levada a várias localidades do país), que continha muitos materiais do EPHEMERA, a partir da segunda metade de 2015, existe uma colecção de livros dedicada à divulgação e estudo dos materiais do ARQUIVO / BIBLIOTECA. Tem como editora a Tinta da China.
O que encontro no EPHEMERA?
Depende. Na maioria dos casos encontra uma listagem dos materiais existentes, identificado pela capa ou rosto ou primeira página, significando que tal livro, jornal, documento, cartaz, panfleto, manuscrito ou objecto se encontra no ARQUIVO / BIBLIOTECA de José Pacheco Pereira. Noutros casos, encontra a brochura, livro, panfleto, etc., completo, clicando na ligação ou na imagem. Como, desde o início do EPHEMERA, nem sempre se seguiu o mesmo critério, nem, em alguns casos, as limitações do WordPress o permitem, não existe uma única maneira de consultar um determinado espécime completo. Nalguns casos, a indicação de CLICAR na imagem para abrir o documento completo significa que é essa a maneira de o abrir, noutros casos a ligação vem em baixo, ou está na indicação “Completo”.
Existem prioridades na procura e aquisição do material do EPHEMERA?
Num certo sentido procuro tudo. O animus de coleccionar, com a sua particular obsessão, conhece poucos limites. O monstro tem sempre que ser alimentado. Mas, claro que há prioridades. Uma, tem a ver com a natureza do ARQUIVO / BIBLIOTECA que tem uma especialidade na política e na história política contemporânea, mesmo que existam algumas colecções bem estranhas: meteorologia do século XIX e um vasto número de cartas de amor do século XX, por exemplo. Mas a especialidade e a especialização é a política e história do século XIX a XXI.
Dentro desta especialização, a prioridade é para os arquivos e espólios que contêm manuscritos, documentos, espécies únicas. Estão cá e em mais sítio nenhum. É o caso dos papéis de Sá Carneiro, o arquivo da União Socialista, ou do PCP(ML) /Norte, os papéis da censura, os espólios de José Carlos Ferreira de Almeida, de Joaquim Barros de Sousa, de José Borrego, de Nuno Rodrigues dos Santos, de Carlos da Fonseca, de Vítor Crespo, de Arnaldo Fleming, da campanha eleitoral de Maria de Lourdes Pintasilgo, ou da Associação Portugal Único, entre outros.
Depois, as colecções alimentam-se a si próprias. Por exemplo, existe uma grande colecção dos movimentos extremistas da esquerda e da direita, que tem prioridade na recolha e nas aquisições, em particular fora de Portugal. De um modo geral, pasta que já exista tem prioridade em ser completada.
[em construção]
Como é tratado todo este material? Quais os procedimentos de entrada e saída?
[em construção]
Falta muito para se publicarem todos os materiais do EPHEMERA?
Falta mesmo muito. Uma pequena eternidade ao ritmo actual e, mesmo acelerando, continuará a faltar muito, muito tempo. De um modo geral, quase tudo o que tem vindo a ser publicado são os novos materiais que entram e apenas por arrasto alguns já existentes para completar as pastas.
Posso usar o material do EPHEMERA?
Salvo indicação em contrário, pode usar à vontade o material do EPHEMERA desde que indique a sua origem. Materiais do EPHEMERA já foram usados em filmes, documentários televisivos, livros, artigos, exposições, em artigos da Wikipedia nacionais e estrangeiros, blogues, sites, etc.
Quem, onde e quantos lêem o EPHEMERA?
O EPHEMERA é visto por cerca de 1000 pessoas por dia, cerca de mais de 30.000 por mês numa estimativa muito conservadora. A esta data (Junho de 2015) há 2.311.338 visualizações. Existe um padrão regular na sua consulta e que tem a ver com a actividade do blogue, o que mostra como os seus leitores estão atentos à colocação de novas notas. Se o blogue fica inactivo durante algum tempo há um tráfego de cerca de 600 pessoas diárias, quando se reactiva, ultrapassa quase de imediato as mil, sendo o número máximo de visitas num dia de 19.222. A actualidade política e o interesse especial de algumas notas atraem mais leitores, o que é normal.
O EPHEMERA é lido e consultado fora de Portugal, nomeadamente no Brasil, nos PALOPs, Espanha e nos EUA. Cerca de 30% das visualizações são de fora de Portugal.
Quem usa o material do EPHEMERA?
Os leitores do EPHEMERA são muito regulares e as procuras nos motores de busca revelam interesses muito amplos. Há muitas procuras de carácter académico (associadas a investigações universitárias) ou jornalísticas (os materiais sobre a campanha eleitoral de Passos Coelho na Amadora são procurados quando um jornal ou revista está a fazer “perfis biográficos”). Os académicos citam, os jornalistas não. Um complemento natural dessas procuras são os pedidos de consulta ao ARQUIVO / BIBLIOTECA propriamente dito ou pedidos de esclarecimento e informação complementar por email.
Esta última parte tem funcionado mal por falta de tempo, agravado pela entrada sucessiva de espólios muito grandes.
O uso que os leitores fazem dos materiais é muito diverso. No Brasil há quem os use nas aulas, nos EUA num blogue sobre banda-desenhada, em Portugal em livros, filmes e artigos. Há quem o use no mercado alfarrabista para avaliar livros e papéis. Há alguns pedidos de carácter genealógico, e por pessoas cujo paradeiro se perdeu. Há papéis que suscitam memórias pessoais. Há familiares que encontram traços da vida dos seus pais, ou amigos de amigos ou que usam o EPHEMERA para os procurar. Há quem peça, como um candidato a deputado brasileiro, por apoio para fazer panfletos e músicas eleitorais.
Como posso contribuir para o EPHEMERA?
[em construção]
Qual será o destino final de tudo isto?
[em construção]
Num artigo que publiquei em 2012 no Público e em entrevistas posteriores referi-me a essa questão. Transcrevo um fragmento desse artigo (está completo aqui):
Deixar de herança não é solução, porque uma vez atingida uma certa dimensão, só uma dedicação quase absoluta pode continuar este trabalho. Nenhuma destas colecções aguentou mais do que duas gerações e raras chegaram às três, e compreende-se que assim seja. Havia depois três alternativas: vender, doar ao Estado, criar uma fundação.
Vender está para mim fora de causa, mas às vezes apetece e compreendo que alguns o façam: perante a incúria do Estado e a hostilidade corrente. Apetece pegar nas coisas e melhorar a vida com a recompensa não só dos gastos como do trabalho de organização, que, como se sabe, é um dos principais valores incorporados. E claro que há mercado, a começar por muitas instituições estrangeiras que estão aí bem presentes no país, a comprar espólios únicos, cujos donos, por necessidade ou raiva com a sua terra e as suas instituições, os preferem vender. Não é o meu caminho.
Doar ao Estado é contrário ao espírito deste tipo de caça-recolecção, que é suposto ser uma actividade da sociedade e na sociedade, complementar mas diferente daquela que realizam instituições que têm meios e recursos muito maiores, mas que também paralisam mais facilmente. De igual modo, a sensibilidade arquivista do Estado é demasiado conservadora e não é por acaso que instituições como a BDIC, a Hoover e o Instituto de História Social de Amesterdão começaram de forma diferente e evoluíram de forma diferente. Para além disso, o Estado não cuida dos seus bens, e muito menos vai fazê-lo nos tempos mais próximos. Espólios doados ao Estado, quando este os aceita, visto que muitos são recusados, estão por tratar, fechados e inacessíveis.
Sobra a criação de uma fundação, que até há uns meses era uma actividade benemerente, vista positivamente pela comunidade, hoje passa por ser uma actividade criminosa. Há cada vez mais dificuldades e não é pelas razões moralizadoras que por aí circulam. Dois grandes responsáveis por esse processo de ignomínia das fundações são os que abusaram do seu estatuto, incluindo grandes empresas que usaram e usam as fundações para operações fiscais, e o Estado, que permitiu esses abusos e cometeu ele próprio o maior, ao usar o estatuto das fundações para desorçamentação e para alargar o campo dos jobs for the boys.
É interessante verificar que, depois de um relatório feito com os pés, a maioria das aberrações continua a funcionar e a única coisa que vai ficar é uma lei mal feita, cheia de erros, estatista e prepotente, assente na desconfiança do Estado em relação a tudo o que seja privado, e obrigando as fundações a gastar os seus recursos mais para manter uma burocracia interna do que para prosseguir os fins que os seus doadores pretendiam.
Sim, porque o acto inicial de uma fundação privada é uma oferta a todos de bens até então privados, e muitas fundações podem viver sem dinheiros do Estado. Podiam, mais do que o que podem, porque o Estado, em vez de usar a concessão da utilidade pública como mecanismo de distinguir quem a tem, de quem apenas a quer para obter benefícios fiscais, prefere destruir esse mecanismo de doação aos portugueses, que é a criar uma instituição de serviço público, que actua em áreas onde ou não há dinheiro do Estado, ou onde a centralização desertificou recursos e oportunidades.
Eu, que fui estúpido em não querer nunca criar uma fundação enquanto tive funções políticas, e que sou igualmente estúpido em vir falar disto em público, vejo-me agora a braços com uma lei absurda que só atinge quem quer, como antes se dizia e agora não se usa, “fazer o bem”, sem impedir qualquer abuso quer do Estado, quer daqueles que por aí passam com um olho, em terras de cegos. Vamos ver como as coisas evoluem.
Está anunciada uma nova lei das Fundações, que espero crie melhores condições e corrija os erros da anterior. Os critérios usados para as grandes Fundações (como a Gulbenkian, Serralves, Casa da Música, EDP, etc.) não se adequam a Fundações mais pequenas. É necessário que exista uma legislação equilibrada para pequenas fundações que possam ser sustentáveis, sem a imposição de grandes ónus burocráticos e com respeito pela vontade dos fundadores.
PARA SABER MAIS SOBRE O EPHEMERA
Facebook dos Amigos do Ephemera
Twitter dos Amigos do Ephemera
Maria de Lurdes Lopes / Lusa), “Pacheco Pereira diz que a sua biblioteca “não pode continuar privada”, Público, 4 de Maio de 2012.
OFÍCIO DE CAÇA E RECOLECÇÃO (PÚBLICO, 3 DE NOVEMBRO DE 2012)
RESTOS E RASTROS (PÚBLICO DE 20 DE JULHO DE 2013)
Cadernos BAD, 1-2, 2012-1913 (excerto aqui.)
As bibliotecas no Século XXI, Livros e Bibliotecas: Pacheco Pereira at TEDxFCTUNL
O MAIS PÚBLICO DOS ARQUIVOS PRIVADOS
O que é o EPHEMERA?
EPHEMERA é um blogue destinado a colocar a público materiais do ARQUIVO / BIBLIOTECA de José Pacheco Pereira. Trata-se de um acervo privado constituído por três fontes principais: a biblioteca e papéis da família Pacheco Pereira, que se encontravam no seu grosso na posse de Álvaro Pacheco Pereira, falecido em 2012; a biblioteca e arquivo de José Pacheco Pereira, cujas primeiras aquisições próprias datam de 1963; e um vasto conjunto de ofertas que vão desde bibliotecas inteiras a espólios completos, para além de muitos núcleos mais pequenos e um contínuo fluxo de materiais, comprados mas, na sua maioria, oferecidos.
É um acervo no seu conjunto generalista, mas com uma forte componente especializada na história política contemporânea, com materiais de arquivo e com colecções únicos em Portugal em certas áreas (como é o caso da colecção de ephemera associada à actividade política). Os espólios mais importantes, cuja lista provisória se encontra em ARQUIVOS INDIVIDUAIS, DE FAMÍLIAS E DE INSTITUIÇÕES, ESPÓLIOS, PAPÉIS, CORRESPONDÊNCIA, FOTOGRAFIAS, VÁRIOS, permitem-me dizer que não é possível estudar muitos aspectos da história contemporânea portuguesa sem passar por aqui.
Por que é que o EPHEMERA não se limita a conservar e divulgar os materiais recolhidos e “cobre” eventos contemporâneos?
Dada a natureza das suas colecções, elas implicam não apenas as aquisições e doações passivas, mas também uma recolha activa, em particular nos eventos cuja cobertura mediática é nula, escassa e “espectacular”, e onde os materiais originais são altamente perecíveis. Que eu saiba ninguém o faz em Portugal e mesmo na maioria dos países europeus, tal prática é pouco comum. Apenas o British Museum enviou uma equipa para recolha dos materiais relativos às manifestações estudantis. No EPHEMERA encontra-se já uma cobertura documental muito completa de várias manifestações, pequenas e grandes, dos últimos anos, que inclui fotografias não só das pessoas, mas também dos cartazes, panfletos, outros materiais, etc.
O EPHEMERA é português ou estrangeiro?
O EPHEMERA é internacional. Tem até hoje (Junho de 2015) materiais de 102 países e de várias organizações internacionais ou transnacionais. Mas o grosso é obviamente português. Porém, desde início se considerou que era importante comparar, por exemplo, entre a propaganda eleitoral europeia e americana, entre a propaganda dos anos trinta e a dos anos sessenta. Movimentos como os comunistas ou a extrema-direita, que têm uma identidade nacional e internacional “forte”, ganham também no exercício comparativo.
De um artigo nos Cadernos BAD: Qual é o “projecto” central desta caça e recolecção? Existe um, mesmo que depois conviva com outras colecções acessórias que vem de arrasto, como aliás é habitual em todos os projectos do mesmo tipo. É o de fazer uma espécie de pequena Bibliothèque de Documentation Internationale Contemporaine (BDIC) em Paris, ou se se quiser uma pequeníssima Hoover Institution on War, Revolution, and Peace, em Stanford, ou um embrião de Instituto de História Social de Amsterdão, para o caso português. Dois arquivos prosseguem objectivos próximos, o Centro de Documentação 25 de Abril da Universidade de Coimbra, e a Fundação Mário Soares. A natureza das suas colecções é semelhante, tem muitos aspectos complementares, embora haja diferenças. Mas é esse o sentido do “core business” desta caça e recolecção.
Está tudo bem no EPHEMERA?
Não, não está. Longe disso. Nem sempre as digitalizações são perfeitas, as fotografias de qualidade, as colecções não estão completas, a cobertura de determinados eventos políticos e sociais, organizações, grupos e partidos é desigual, a distribuição cronológica e geográfica é irregular, a publicação em linha conhece altos e baixos, e há erros que passam despercebidos. Muitas vezes faz falta um texto de enquadramento ou indicações complementares sobre os materiais divulgados. Mas o EPHEMERA é um trabalho de amador que depende do tempo do seu autor e do voluntarismo de quem o tem ajudado e, quem não tem cão, caça com gato.
Quanto custa o EPHEMERA?
Bastante. Muito. Mesmo muito.
Não há um tostão do Estado no EPHEMERA, mesmo quando o seu output na Internet e na preservação e divulgação de documentos únicos e raros, é mais significativo do que muitas entidades altamente subsidiadas com centenas de milhares de euros. Foi assim e vai continuar assim. Sai-me do bolso, nada é dedutível, mas há piores maneiras de gastar dinheiro.
Custa em software e em serviços na rede, em máquinas (scanners, etc.) material de papelaria, estantaria, transportes, luz e água, casas, reconstrução e manutenção de casas, espaço, acima de tudo espaço. Ocasionalmente há serviços pagos como, por exemplo, reproduções de qualidade de cartazes, algumas digitalizações ou transferência de meios (do vinil para CD). Mas são uma excepção muito excepcional, a maioria do trabalho é feito in camera por mim ou por amigos do EPHEMERA.
Os custos de aquisição de livros, papeis, arquivos, espólios, revistas, jornais, etc. quer em Portugal, quer no estrangeiro, tem subido muito, porque as colecções alimentam-se a si próprias e exigem uma procura constante quer nos alfarrabistas, quer em leilões, quer na Internet. Para além disso, há um efeito perverso de sítios como o EPHEMERA: criam um mercado onde ele antes não existia, um mercado muito caótico e predador, que muitas vezes dispersa o que devia permanecer unido. É verdade que tem também um efeito positivo: muita coisa que iria para o lixo, pode agora ser salva.
Mas o mais caro é o tempo. Mais caro que tudo. E o EPHEMERA tem um custo gigantesco em tempo, o bem mais precioso, embora este tipo de trabalho, que aproveita a todos, tenha por cá muito pouco reconhecimento. Seja pelo gosto de o fazer.
É um blogue a melhor forma de divulgar os materiais do EPHEMERA?
Não é. Trata-se de uma opção de circunstância que implica baixo custo (mas não custo zero, porque o espaço de armazenamento, e certas funcionalidades são pagas) e que implica facilidade de colocação dos materiais e exige pouco conhecimento especializado. O WordPress oferece a possibilidade de se criar um CMS (content management system) razoável, mas está longe de poder fornecer a organização e funcionalidades dos sítios profissionais com bases de dados dedicadas. Este site pretende ser a primeira tentativa de combinar o blogue com um local fixo.
Existem outras formas de divulgação dos materiais do EPHEMERA?
Sim. Para além de exposições, como a que se realizou nas comemorações do 40º aniversário do 25 de Abril na Assembleia da República (e depois levada a várias localidades do país), que continha muitos materiais do EPHEMERA, a partir da segunda metade de 2015, existe uma colecção de livros dedicada à divulgação e estudo dos materiais do ARQUIVO / BIBLIOTECA. Tem como editora a Tinta da China.
O que encontro no EPHEMERA?
Depende. Na maioria dos casos encontra uma listagem dos materiais existentes, identificado pela capa ou rosto ou primeira página, significando que tal livro, jornal, documento, cartaz, panfleto, manuscrito ou objecto se encontra no ARQUIVO / BIBLIOTECA de José Pacheco Pereira. Noutros casos, encontra a brochura, livro, panfleto, etc., completo, clicando na ligação ou na imagem. Como, desde o início do EPHEMERA, nem sempre se seguiu o mesmo critério, nem, em alguns casos, as limitações do WordPress o permitem, não existe uma única maneira de consultar um determinado espécime completo. Nalguns casos, a indicação de CLICAR na imagem para abrir o documento completo significa que é essa a maneira de o abrir, noutros casos a ligação vem em baixo, ou está na indicação “Completo”.
Existem prioridades na procura e aquisição do material do EPHEMERA?
Num certo sentido procuro tudo. O animus de coleccionar, com a sua particular obsessão, conhece poucos limites. O monstro tem sempre que ser alimentado. Mas, claro que há prioridades. Uma, tem a ver com a natureza do ARQUIVO / BIBLIOTECA que tem uma especialidade na política e na história política contemporânea, mesmo que existam algumas colecções bem estranhas: meteorologia do século XIX e um vasto número de cartas de amor do século XX, por exemplo. Mas a especialidade e a especialização é a política e história do século XIX a XXI.
Dentro desta especialização, a prioridade é para os arquivos e espólios que contêm manuscritos, documentos, espécies únicas. Estão cá e em mais sítio nenhum. É o caso dos papéis de Sá Carneiro, o arquivo da União Socialista, ou do PCP(ML) /Norte, os papéis da censura, os espólios de José Carlos Ferreira de Almeida, de Joaquim Barros de Sousa, de José Borrego, de Nuno Rodrigues dos Santos, de Carlos da Fonseca, de Vítor Crespo, de Arnaldo Fleming, da campanha eleitoral de Maria de Lourdes Pintasilgo, ou da Associação Portugal Único, entre outros.
Depois, as colecções alimentam-se a si próprias. Por exemplo, existe uma grande colecção dos movimentos extremistas da esquerda e da direita, que tem prioridade na recolha e nas aquisições, em particular fora de Portugal. De um modo geral, pasta que já exista tem prioridade em ser completada.
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Como é tratado todo este material? Quais os procedimentos de entrada e saída?
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Falta muito para se publicarem todos os materiais do EPHEMERA?
Falta mesmo muito. Uma pequena eternidade ao ritmo actual e, mesmo acelerando, continuará a faltar muito, muito tempo. De um modo geral, quase tudo o que tem vindo a ser publicado são os novos materiais que entram e apenas por arrasto alguns já existentes para completar as pastas.
Posso usar o material do EPHEMERA?
Salvo indicação em contrário, pode usar à vontade o material do EPHEMERA desde que indique a sua origem. Materiais do EPHEMERA já foram usados em filmes, documentários televisivos, livros, artigos, exposições, em artigos da Wikipedia nacionais e estrangeiros, blogues, sites, etc.
Quem, onde e quantos lêem o EPHEMERA?
O EPHEMERA é visto por cerca de 1000 pessoas por dia, cerca de mais de 30.000 por mês numa estimativa muito conservadora. A esta data (Junho de 2015) há 2.311.338 visualizações. Existe um padrão regular na sua consulta e que tem a ver com a actividade do blogue, o que mostra como os seus leitores estão atentos à colocação de novas notas. Se o blogue fica inactivo durante algum tempo há um tráfego de cerca de 600 pessoas diárias, quando se reactiva, ultrapassa quase de imediato as mil, sendo o número máximo de visitas num dia de 19.222. A actualidade política e o interesse especial de algumas notas atraem mais leitores, o que é normal.
O EPHEMERA é lido e consultado fora de Portugal, nomeadamente no Brasil, nos PALOPs, Espanha e nos EUA. Cerca de 30% das visualizações são de fora de Portugal.
Quem usa o material do EPHEMERA?
Os leitores do EPHEMERA são muito regulares e as procuras nos motores de busca revelam interesses muito amplos. Há muitas procuras de carácter académico (associadas a investigações universitárias) ou jornalísticas (os materiais sobre a campanha eleitoral de Passos Coelho na Amadora são procurados quando um jornal ou revista está a fazer “perfis biográficos”). Os académicos citam, os jornalistas não. Um complemento natural dessas procuras são os pedidos de consulta ao ARQUIVO / BIBLIOTECA propriamente dito ou pedidos de esclarecimento e informação complementar por email.
Esta última parte tem funcionado mal por falta de tempo, agravado pela entrada sucessiva de espólios muito grandes.
O uso que os leitores fazem dos materiais é muito diverso. No Brasil há quem os use nas aulas, nos EUA num blogue sobre banda-desenhada, em Portugal em livros, filmes e artigos. Há quem o use no mercado alfarrabista para avaliar livros e papéis. Há alguns pedidos de carácter genealógico, e por pessoas cujo paradeiro se perdeu. Há papéis que suscitam memórias pessoais. Há familiares que encontram traços da vida dos seus pais, ou amigos de amigos ou que usam o EPHEMERA para os procurar. Há quem peça, como um candidato a deputado brasileiro, por apoio para fazer panfletos e músicas eleitorais.
Como posso contribuir para o EPHEMERA?
[em construção]
Qual será o destino final de tudo isto?
[em construção]
Num artigo que publiquei em 2012 no Público e em entrevistas posteriores referi-me a essa questão. Transcrevo um fragmento desse artigo (está completo aqui):
Deixar de herança não é solução, porque uma vez atingida uma certa dimensão, só uma dedicação quase absoluta pode continuar este trabalho. Nenhuma destas colecções aguentou mais do que duas gerações e raras chegaram às três, e compreende-se que assim seja. Havia depois três alternativas: vender, doar ao Estado, criar uma fundação.
Vender está para mim fora de causa, mas às vezes apetece e compreendo que alguns o façam: perante a incúria do Estado e a hostilidade corrente. Apetece pegar nas coisas e melhorar a vida com a recompensa não só dos gastos como do trabalho de organização, que, como se sabe, é um dos principais valores incorporados. E claro que há mercado, a começar por muitas instituições estrangeiras que estão aí bem presentes no país, a comprar espólios únicos, cujos donos, por necessidade ou raiva com a sua terra e as suas instituições, os preferem vender. Não é o meu caminho.
Doar ao Estado é contrário ao espírito deste tipo de caça-recolecção, que é suposto ser uma actividade da sociedade e na sociedade, complementar mas diferente daquela que realizam instituições que têm meios e recursos muito maiores, mas que também paralisam mais facilmente. De igual modo, a sensibilidade arquivista do Estado é demasiado conservadora e não é por acaso que instituições como a BDIC, a Hoover e o Instituto de História Social de Amesterdão começaram de forma diferente e evoluíram de forma diferente. Para além disso, o Estado não cuida dos seus bens, e muito menos vai fazê-lo nos tempos mais próximos. Espólios doados ao Estado, quando este os aceita, visto que muitos são recusados, estão por tratar, fechados e inacessíveis.
Sobra a criação de uma fundação, que até há uns meses era uma actividade benemerente, vista positivamente pela comunidade, hoje passa por ser uma actividade criminosa. Há cada vez mais dificuldades e não é pelas razões moralizadoras que por aí circulam. Dois grandes responsáveis por esse processo de ignomínia das fundações são os que abusaram do seu estatuto, incluindo grandes empresas que usaram e usam as fundações para operações fiscais, e o Estado, que permitiu esses abusos e cometeu ele próprio o maior, ao usar o estatuto das fundações para desorçamentação e para alargar o campo dos jobs for the boys.
É interessante verificar que, depois de um relatório feito com os pés, a maioria das aberrações continua a funcionar e a única coisa que vai ficar é uma lei mal feita, cheia de erros, estatista e prepotente, assente na desconfiança do Estado em relação a tudo o que seja privado, e obrigando as fundações a gastar os seus recursos mais para manter uma burocracia interna do que para prosseguir os fins que os seus doadores pretendiam.
Sim, porque o acto inicial de uma fundação privada é uma oferta a todos de bens até então privados, e muitas fundações podem viver sem dinheiros do Estado. Podiam, mais do que o que podem, porque o Estado, em vez de usar a concessão da utilidade pública como mecanismo de distinguir quem a tem, de quem apenas a quer para obter benefícios fiscais, prefere destruir esse mecanismo de doação aos portugueses, que é a criar uma instituição de serviço público, que actua em áreas onde ou não há dinheiro do Estado, ou onde a centralização desertificou recursos e oportunidades.
Eu, que fui estúpido em não querer nunca criar uma fundação enquanto tive funções políticas, e que sou igualmente estúpido em vir falar disto em público, vejo-me agora a braços com uma lei absurda que só atinge quem quer, como antes se dizia e agora não se usa, “fazer o bem”, sem impedir qualquer abuso quer do Estado, quer daqueles que por aí passam com um olho, em terras de cegos. Vamos ver como as coisas evoluem.
Está anunciada uma nova lei das Fundações, que espero crie melhores condições e corrija os erros da anterior. Os critérios usados para as grandes Fundações (como a Gulbenkian, Serralves, Casa da Música, EDP, etc.) não se adequam a Fundações mais pequenas. É necessário que exista uma legislação equilibrada para pequenas fundações que possam ser sustentáveis, sem a imposição de grandes ónus burocráticos e com respeito pela vontade dos fundadores.
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Maria de Lurdes Lopes / Lusa), “Pacheco Pereira diz que a sua biblioteca “não pode continuar privada”, Público, 4 de Maio de 2012.
OFÍCIO DE CAÇA E RECOLECÇÃO (PÚBLICO, 3 DE NOVEMBRO DE 2012)
RESTOS E RASTROS (PÚBLICO DE 20 DE JULHO DE 2013)
Cadernos BAD, 1-2, 2012-1913 (excerto aqui.)
As bibliotecas no Século XXI, Livros e Bibliotecas: Pacheco Pereira at TEDxFCTUNL